segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Ambulante

Ele é qualquer um. Não precisa ter cara e usa isso sem se dar conta. Entra num ônibus qualquer, numa vida qualquer, num papel qualquer. Hoje, precisa só de sua cicatriz, geralmente mais útil do que sua cara e seu nome.
Não é bom contando histórias, elas sequer fazem sentido, mas isso pouco importa. Ao lado do motorista fez uma cirurgia no joelho por causa de uma doença grave, dois passos depois e tomou um tiro, mais dois e foi atropelado. Ao passar por mim sequer continua a mancar. Vendedor versátil, vende balas, chicletes, chocolates, e o seu maior sucesso: o descanso para a culpa que todos sentem por serem invisíveis. Culpa por todos os problemas pelos quais são responsáveis. Família, violência, drogas. Uma história para cada culpa. Todos pagam por volta de 0,50 centavos. A reza prática dos tempos modernos e corridos, e sentem o pequeno perdão.
O homem vai embora agradecido. Todos voltam a cochilar, a se espremer, a olhar o vazio. Um peso a menos ou um doce a mais, a espera do tempo seguinte.

Desculpe por incomodar o silêncio e a viagem de vocês.